Este é o relatório de uma mesa-redonda imaginária sobre democracia, presente e futura. Esta discussão entre três pensadores foi moderada por este blog com a assistência do M365 Copilot.
Introdução: A Democracia chegou a uma Encruzilhada
A democracia, outrora celebrada como a garantia máxima de liberdade e estabilidade, agora enfrenta um paradoxo. É globalmente dominante, mas profundamente frágil. Das ondas populistas à governança algorítmica, das crises climáticas à fragmentação geopolítica, a questão já não é se a democracia prevalecerá, mas se ela se consegue adaptar sem perder a sua essência.
Para explorar esse dilema, meu blog reuniu uma extraordinária mesa-redonda fictícia: Platão (Grécia, século IV a.C.), o filósofo que primeiro analisou as vulnerabilidades da democracia; Yuval Noah Harari, historiador e futurista nascido em Israel (1976); e Victor Ângelo (nascido em 1949 em Portugal), diplomata veterano, estrategista de segurança e colunista. O diálogo assim gerado atravessa milênios, entrelaçando sabedoria antiga com urgência contemporânea.
I. Platão: Os Perigos do Excesso de Liberdade
Platão começa com um alerta que ecoa através dos séculos:
“A democracia surge da liberdade, mas a liberdade sem restrições gera desordem. Quando os cidadãos valorizam a liberdade acima da virtude, promovem aduladores em vez de guardiões. Agora, vejo as democracias intoxicadas pela multiplicidade de opiniões, confundindo ruído com sabedoria.”
A crítica de Platão não representa nostalgia pela aristocracia; é um chamamento para uma governança racional. Para ele, o calcanhar de Aquiles da democracia está em sua suscetibilidade à demagogia — uma vulnerabilidade ampliada hoje pelas redes sociais e pela retórica populista.
Platão refere-se então a um estudo de caso histórico: Atenas e a Queda da Polis, um exemplo que recomenda não ser esquecido. No século V a.C., Atenas foi pioneira na democracia direta, concedendo aos cidadãos uma voz sem precedentes. No entanto, essa liberdade gerou volatilidade. Demagogos como Cléon exploraram as paixões populares, levando a decisões imprudentes como a Expedição Siciliana — um desastre que apressou o declínio de Atenas.
II. Harari: Poder Além da Política
Harari muda o foco da teoria política para a realidade tecnológica: “Platão temia as massas populares; hoje, tememos o algoritmo. O poder já não reside apenas nos parlamentos — ele flui por fluxos de dados. O capitalismo de vigilância e a IA moldam as vontades antes mesmo dos cidadãos votarem.”
Harari argumenta que a assimetria da informação — outrora privilégio dos reis — agora pertence aos gigantes da tecnologia. As democracias precisam se reinventar não apenas para regular a tecnologia, mas para redefinir a liberdade numa era em que a autonomia é ameaçada algoritmicamente. Harari mostra preocupar-se com a fragilidade das instituições. E acrescenta que a República de Weimar (1919–1933) oferece uma lição sóbria. Nascida das cinzas do império, abraçou ideais democráticos, mas faltou resiliência institucional. Crises económicas e propaganda minaram a confiança, abrindo caminho para o autoritarismo. As democracias atuais enfrentam riscos semelhantes — não pela hiperinflação, mas pela desordem informacional.
III. Ângelo: A Dimensão Geopolítica
Victor Ângelo traz uma perspectiva prática: “A democracia continua sendo o sistema mais legítimo, mas a legitimidade está sob ataque. O populismo explora o medo; a desinformação corrói a confiança e promove o ódio. Enquanto isso, a governança global perde terreno face às ameaças transnacionais — mudanças climáticas, ciberguerra, cartéis internacionais do crime, pandemias.”
Para Ângelo, o desafio está na no êxito ou no fracasso da ação coletiva. Nenhuma democracia pode ser protegida sozinha, apenas ao nível nacional ou local, quando as crises não têm fronteiras. Por isso, friza a necessidade de alianças de valores, ancoradas em direitos humanos e no Estado de Direito, para enfrentar o ressurgimento autoritário e os choques sistêmicos.
Ângelo lembra o otimismo pós-Guerra Fria que foi substituído agora por pessimismo e medo: “Os anos 1990 foram saudados como o ‘fim da história’ (Fukuyama, 1992), com a democracia liberal aparentemente triunfante. No entanto, o momento unipolar gerou complacência. Instituições como a ONU e a OTAN tiveram dificuldades para se adaptar às novas ameaças assimétricas, enquanto a globalização superou a governança. O resultado: um vácuo explorado por poderes autoritários e atores não estatais.”
Os participantes discutiram então alguns exemplos que mostram as pressões atuais sobre a democracia. Por exemplo, o EU Digital Services Act (DSA) e o Digital Markets Act (DMA) representam esforços pioneiros para regular monopólios tecnológicos e conter a desinformação. No entanto, a sua aplicação permanece desigual, e a governança da IA ainda é embrionária. É também uma questão vista de forma diferente por europeus e, do outro lado do Atlântico, pelos líderes dos EUA e pelos principais empreendedores digitais baseados na América.
Ainda nos EUA, polarização e negação eleitoral têm minado as normas democráticas. O ataque ao Capitólio a 6 de janeiro destacou as vulnerabilidades existentes na resiliência institucional. Ângelo acrescentou que as decisões do Presidente Trump tomadas desde o início do seu segundo mandato desafiaram igualmente a autoridade de instituições-chave que desempenham um papel vital no equilíbrio dos poderes. Essas decisões devem ser vistas como ameaças sérias à democracia constitucional, ao equilíbrio democrático e aos media, entre outros.
Outras situações também foram mencionadas. Índia: A maior democracia do mundo enfrenta desafios resultantes de políticas majoritárias assentes na pertença étnica e nas restrições à liberdade de imprensa, levantando questões sobre o equilíbrio entre estabilidade e pluralismo. O Sul Global: Democracias na África e América Latina enfrentam crises de dívida e choques climáticos, que atores autoritários exploram para minar a governança democrática.
O Moderador pediu então que se identificassem as principais recomendações políticas que poderão responder à tendência para o definhamento das democracias.
Os participantes listaram várias ações que devem ser consideradas:
- Educação cívica para a era digital;
- Inserir pensamento crítico e alfabetização mediática nos currículos nacionais;
- Promover conscientização ética sobre IA entre cidadãos e líderes;
- Expandir estruturas como o EU Digital Services Act para incluir transparência algorítmica;
- Estabelecer órgãos multilaterais para governança de IA;
- Proteger a independência e a eficiência da justiça e dos órgãos de referência da comunicação social;
- Desenvolver mecanismos de resposta rápida para assegurar a integridade eleitoral e as ameaças cibernéticas;
- Criar um Fórum de Parceria pela Democracia, no quadro do Sistema ONU, para ação global coordenada;
- Vincular acordos comerciais a padrões democráticos.
Para concluir a mesa redonda, o Moderador afirmou que a discussão permitiu sublinhar que a democracia não é uma conquista estática; é uma tarefa contínua. Como lembra Platão, liberdade sem virtude conduz à tirania. Harari alerta que adaptabilidade é o preço da sobrevivência. Ângelo destaca que a solidariedade global e verdadeira é o seguro de vida da democracia em um mundo fragmentado.
Antes de encerrar o debate e agradecer aos três participantes, o Moderador levantou uma última questão: Qual é o futuro da democracia?
- Platão: Sem sabedoria, a democracia é facilmente substituída por tirania. Cultive a razão acima da paixão.
- Harari: Sem adaptabilidade, a democracia torna-se obsoleta. Aceite a inovação, mas proteja-se dos seus perigos.
- Ângelo: Sem solidariedade, a democracia enfraquece. Construa confiança — dentro das sociedades e entre as nações.
Moderador: Obrigado, senhores. O diálogo entre a reflexão do passado e a urgência do presente lembra-nos que a democracia não é um dado intocável; a sua defesa é uma tarefa sem fim.
Fim da mesa-redonda imaginária.